Os próximos 18 meses serão cruciais para salvar o planeta
Consenso entre especialistas. O ano de
2020 é visto como chave no combate ao aquecimento; para alguns, é o
limite para a redução de emissões de dióxido de carbono - e para
que a meta de aumento de 1,5ºC na temperatura global seja mantida.
BBC
25/07/2019 08h32
Lembra-se quando se dizia que
tínhamos "12 anos para salvar o planeta" ?
Agora, porém, há um consenso
crescente de que os próximos 18 meses serão primordiais para se
lidar com a crise do aquecimento global e das mudanças climáticas,
entre outros desafios ambientais.
No ano passado, o Painel
Inter governamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) informou que,
para manter o aumento das temperaturas médias globais abaixo de
1,5 ºC até o final deste século, as emissões de dióxido de
carbono teriam que ser reduzidas em 45% até 2030.
Mas hoje, os cientistas reconhecem que
os passos políticos decisivos para permitir que os cortes no carbono
ocorram de facto terão de ser dados antes do final do próximo ano.
A ideia de que 2020 é um prazo
importante foi abordada por um dos principais cientistas do clima do
mundo, em 2017. "A matemática do clima é brutalmente clara:
embora o mundo não possa ser curado nos próximos anos, pode ser
fatalmente ferido por negligência até 2020", disse Hans
Joachim Schellnhuber, fundador e actual director emérito do
Instituto Potsdam de Pesquisas sobre o Impacto Climático.
A sensação de que o final do próximo
ano seria uma espécie de prazo de última chance para conter os
efeitos devastadores das mudanças climáticas está ficando cada vez
mais evidente.
"Acredito firmemente que os
próximos 18 meses decidirão nossa capacidade de manter a mudança
climática em níveis de sobrevivência e restaurar a natureza ao
equilíbrio que precisamos para nossa sobrevivência", disse o
príncipe Charles, falando numa recepção recente para ministros do
Commonwealth, a comunidade que aglutina o Reino Unido e várias
ex-colónias britânicas.
Então, porque são tão importantes os
próximos 18 meses?
O príncipe Charles estava-se referindo
a importantes reuniões da ONU sobre o clima, marcadas até o final de
2020. Desde que um acordo climático global foi assinado em Paris, em
Dezembro de 2015, negociadores têm-se empenhado em firmar um
conjunto de normas a serem seguidas pelos signatários do pacto.
Ainda, segundo os termos do acordo, os
países também prometeram avançar com os seus planos de corte de
emissões de carbono até o final de 2020.
Uma dos destaques do relatório do IPCC
lançado no ano passado foi a estimativa de que as emissões globais
de dióxido de carbono têm de atingir seu pico em 2020, para
viabilizar o objectivo do máximo de aumento de 1,5 ºC até o final do
século.
Os planos actuais não são
suficientemente fortes para manter as temperaturas abaixo do chamado
limite seguro.
Neste momento, estamo-nos encaminhando
para 3 ºC de aquecimento até 2100.
Como os países geralmente planeiam
seus programas de redução com prazos de cinco e dez anos, para se
atingir a meta de corte de carbono de 45% até 2030, os planos
realmente precisam estar na mesa até o final de 2020.
Os próximos passos
O primeiro grande evento será a Cúpula
para Acção Climática, convocada pelo secretário-geral da ONU,
António Guterres. Será realizada em Nova York, em 23 de Setembro.
Guterres tem deixado claro que a cúpula
só fará sentido se os países participantes levarem ofertas
significativas para melhorar seus planos nacionais de corte de
emissões.
Esse encontro será seguido pela COP25
em Santiago do Chile, que terá a importância de manter o processo
em andamento.
Mas o momento-chave deverá ser a
COP26, provavelmente no Reino Unido, que será realizada no final de
2020.
O governo britânico acredita poder
usar a oportunidade da COP26, num eventual mundo pós-Brexit (após a
saída do Reino Unido da União Europeia), para mostrar que a
Grã-Bretanha tem força para construir a vontade política para os
avanços necessários, da mesma forma que os franceses usaram sua
força diplomática para fazer acontecer o acordo de Paris .
"Se obtivermos sucesso na nossa
oferta (para sediar a COP26), garantiremos a construção do acordo
de Paris e reflectiremos nas evidências científicas de que precisamos
ir mais longe e mais rápido", disse recentemente o ministro do
Meio Ambiente do Reino Unido, Michael Gove - na sua última provável fala no cargo (ele terá outro cargo no gabinete do novo
primeiro-ministro, Boris Johnson, que assumiu na quarta-feira).
"E precisamos da COP26 para
garantir que outros países levem a sério suas obrigações e isso
significa liderar pelo exemplo. Juntos, devemos tomar todas as
medidas necessárias para restringir o aquecimento global a pelo
menos 1,5 ºC"
Razões para ser optimista
Nos últimos anos, talvez pelas ondas
extremas de frio e calor, ou pela actividade de activistas como a
adolescente sueca Greta Thunberg e do grupo britânico Extinction
Rebellion (que paralisou Londres durante uma semana em Abril), parece
haver um nítido aumento no interesse público pelas mudanças
climáticas e outros problemas relativos à natureza e por ideias que
as pessoas possam pôr em prática nas suas próprias vidas.
Os pedidos de acção estão ficando
mais vigorosos, e os sinais são de que políticos em muitos países
acordaram para essas mudanças.
Ideias como o New Green Deal, (o Novo
Plano Verde, com acções como a "descarbonização" da
economia americana), proposto por políticos democratas, que pareciam
inviáveis há alguns anos, ganharam força real recentemente.
A percepção do príncipe Charles de
que os próximos 18 meses são críticos é compartilhada por alguns
representantes de países nas negociações sobre o clima.
"Nosso grupo de pequenos estados
insulares em desenvolvimento compartilha do sentimento do príncipe
Charles da profunda urgência por uma acção climática ambiciosa",
disse a embaixadora Janine Felson, do Belize, estrategista-chefe do
grupo da Aliança dos Pequenos Estados Insulares da ONU.
"De uma só vez, somos testemunhas
de uma convergência colectiva da mobilização pública. Os impactos
climáticos estão piorando e há fortes alertas científicos que
pedem uma liderança climática decisiva".
"Sem dúvida, 2020 é um prazo
importante para que a liderança finalmente se manifeste."
Razões para ser pessimista
A provável COP26 no Reino Unido em 2020
também poderia ser o momento em que os EUA finalmente deixariam o
acordo de Paris, conforme Donald Trump anunciou em 2017.
Mas se Trump não vencer nas eleições
americanas do próximo ano, a posição do país pode mudar. Um
presidente democrata, por exemplo, provavelmente reverteria a
decisão.
Qualquer passo pode ter enormes
consequências para a luta pelo clima.
Neste momento, vários países parecem
dispostos a desacelerar as mudanças propostas. Em Dezembro passado,
os EUA, a Arábia Saudita, o Kuwait e a Rússia bloquearam um
relatório especial do IPCC que estabelecia a necessidade de se
manter o tecto dos 1,5ºC de aumento.
Algumas semanas atrás, em Bonna, na
Alemanha, novas objecções da Arábia Saudita impediram que o tema
entrasse em negociações da ONU.
Haverá pressão significativa sobre o
país anfitrião do COP26 em 2010 para que este garanta um progresso
substancial. Mas, se houver um tumulto político em torno do Brexit,
o governo britânico pode não ter estofo necessário para lidar com
os múltiplos desafios globais que a mudança climática apresenta.
"Se não pudermos usar este
momento para acelerar nossas ambições, não teremos hipótese de
chegar a um limite de 1,5 ou 2ºC (de aumento da temperatura)",
disse o professor Michael Jacobs, da Universidade de Sheffield,
ex-assessor para o Clima do ex-primeiro-ministro do Reino Unido,
Gordon Brown.
E isto não é tudo sobre as
mudanças climáticas
Embora as decisões tomadas sobre a
mudança climática no próximo ano sejam críticas, há uma série
de outras reuniões importantes sobre o meio ambiente que moldarão
as acções para a preservação de espécies e a protecção dos
oceanos nas próximas décadas.
No início deste ano, um grande estudo
sobre as perdas de espécies na natureza e resultados mais amplos do
impacto humano causou uma grande agitação entre governos.
O relatório da Plataforma
Inter governamental sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistémicos
mostrou que até um milhão de espécies poderão ser perdidas nas
próximas décadas.
Por causa disto, os governos
reunir-se-ão na China no próximo ano para tentar chegar a um
acordo que proteja animais de todos os tipos.
A Convenção sobre Diversidade
Biológica é o órgão da ONU encarregado de elaborar um plano para
proteger a natureza até 2030.
A reunião do próximo ano poderia
levar a uma espécie de "acordo de Paris" para o mundo
natural. Se houver acordo, é provável que haja ênfase na
agricultura e pesca sustentáveis. Ele deverá pedir maior protecção
às espécies e impor limites ao desmatamento.
No próximo ano, a Convenção das
Nações Unidas sobre as Leis do Mar também se reunirá para
negociar um novo tratado global sobre os oceanos.
Se tudo isto acontecer, o mundo pode
ter uma chance de preservar o meio ambiente.
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