terça-feira, 20 de novembro de 2012

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Do outro lado da Via Láctea resplandesce um palácio feito com os mais subtis materiais. Nele tudo vibra em harmonia sábiamente ordenada. As paredes são tecidas de raios de luar prateados, as colunas douradas são feitas de raios de sol entrançados e os telhados de brumas e nebelinas cintilantes. Este palácio é a morada do Imperador Celeste, que habita nele para governar o universo inteiro. Ele vela pelo bom funcionamento dos três mundos: o Céu, a Terra e os Infernos. Mesmo ajudado por uma corte de ministros e funcionários, todos dignos Imortais, a sua tarefa não é fácil. Controlar o curso dos planetas e a trajectória dos cometas, manter o frágil equilíbrio do Yin e do Yang, sombra e luz, demónios e justos. 
Há sempre acidentes e para evitar catástrofes o Imperador Celeste vê-se obrigado a ter, todos os dias, audiência na sala do trono, onde recebe mensageiros e embaixadores, aconselha-se com os seus ministros, dá ordens e faz justiça.


Numa dessas audiências um mensageiro entregou uma carta que subira em fumo. Vinha da Cidade Proíbida, do Imperador da China.
"Eu, soberano do Império do Meio, vosso humilde servidor por vosso mandato, ouso dirigir-me a Vossa Grandeza, para vos dar conhecimento de uma grave ocorrência acabada de acontecer no meu modesto palácio.
Um macaco imortal de temíveis poderes cometeu um roubo no arsenal, que quase destruiu.
Nós vos suplicamos, pois, que identifiqueis e castigueis o culpado porque, cá em baixo, nada podemos contra um imortal de tal espécie."

Quando leu a carta, o Imperador franziu o sobrolho. Nunca tinha ouvido falar de um macaco imortal.
Ordenou que se fizesse um inquérito.

Apareceu de seguida na sala do trono um funcionário que disse:
- Que Sua Augusta Magestade se digne escutar a queixa do seu humilde servidor, ainda que indigno de lhe dirigir palavra.
Eu, pequeno Rei Dragão, pretendo informá-Lo que um macaco dos mais demoníacos semeou a perturbação e a consternação no meu palácio. Depois de ter cometido estragos consideráveis, roubou-me uma arma e vestes inestimáveis. Para acabar, insultou-me grosseiramente.
Os seus poderes são tais que nem guardas nem eu pudémos dominá-lo. Peço a Sua Grandeza que mande prender este perigoso indivíduo.

O Imperador Celeste fez um esgar e declarou:
- Se se tratar do mesmo macaco não vos inquieteis, em breve o teremos capturado. Já está um inquérito em curso.

Veio então um outro funcionário que se prostrou por três vezes diante do trono e, sem erguer a cabeça, disse:
- O grande perfeito governador do território das Trevas e dos departamentos dos Infernos, envia-me a informar Sua Alteza Suprema de uma terrível desgraça.
Desde a noite dos tempos, o Céu é a morada dos espíritos imortais cuja alma está no caminho da sabedoria e o território das Trevas a residência dos espíritos fantasmas cuja alma ainda deve sofrer e reencarnar para se aperfeiçoar. Além disto, segundo as leis cósmicas, os animais são seres que não podem pretender à imortalidade celeste. 
Ora pela primeira vez desde a criação do Mundo, um ser infringiu esta regra imutável. Trata-se do Rei Macaco, domiciliado no Monte das Flores e dos Frutos. No momento da sua comparência perante o Tribunal dos mortos, ele falsificou o registo das almas e conseguiu fugir, massacrando um grande número de espíritos guardas das Trevas. 
Não tendo meios de capturar este perigoso criminoso, o grande perfeito Yan Luo depõe este assunto nas mãos de Sua Alteza Sereníssima.

O Imperador Celeste bateu com o punho no braço do seu trono e exclamou:
- Esse macaco começa a fazer-nos perder a paciência! 

Suspendeu de imediato a audiência para reunir o conselho de ministros e esperar o resultado do inquérito.
Não tardou que dois finos inquiridores celestes, os grandes inpectores Olho Bem Penetrante e Ouvido Envolvente, viessem dar conta das suas buscas. Explicaram em pormenor quem era o Rei Macaco e confirmaram todos os delitos que ele cometera.

- Muito bem, caros ministros, qual a vossa opinião sobre o castigo que este criminoso merece?
- A morte sumária, rugiu o ministro da guerra, com esse tipo de demónio não se deve hesitar. Enviemos sem demora uma expedição punitiva.
- É incrível, declarou então o espírito da Estrela Polar, ouvir tais propostas no Céu. Esquecestes o princípio elementar dos Imortais: "Ter de vencer é sinal de fraqueza, saber convencer prova de sabedoria"? Este macaco tem algum mérito para ter adquirido a imortalidade e tais dons. Deixemos-lhe uma oportunidade de se redimir e mudemos o veneno em remédio. Dêmos-lhe um posto no Céu. Assim, ele ser-nos-à útil e nós tê-lo-emos sempre debaixo de olho. Ao menor desvio, não teremos sequer de descer à Terra para o punir.

Na sua grande benevolência, o Imperador Celeste optou por este sábio conselho e confiou ao espírito da Estrela Polar o cuidado de o fazer executar.

Depois de atravessar a Via Láctea, pousou no cume do monte das Flores e dos Frutos e admirando a paisagem explêndida dirigiu-se para a cascata das Pérolas.
Um gorila sentinela, ao vê-lo aproximar-se, entrou precipitadamente no palácio para prevenir o chefe da presença de um visitante estranho. Nunca vira um ser de tal espécie, todo cintilante de luz.
O Rei Macaco ajeitou as suas vestes e saiu a ver do que se tratava.

- Eu sou o espírito da Estrela Polar. Sou portador de uma convocatória oficial do Imperador Celeste que vos convida para o seu palácio das Alturas etéreas. Por proposta minha e tendo em conta os vossos méritos, ele quer confiar-vos um importante posto no Céu.
- Oh, venerável estrela, estou louco de alegria. Há algum tempo que desejava ir dar uma voltinha lá pelas alturas. Já viajei na terra e no fundo do mar, já visitei os Infernos mas nunca o Céu. Entrai no meu palácio e bebei uma taça de vinho. Deveis ter sede após tão longa viagem.
- Não, obrigado, o Imperador espera-nos. Está impaciente para vos conhecer.
O Rei Macaco disse, então, ao seu povo:
- Queridos amigos, vou fazer uma viagem às Alturas. Sede sensatos. Não demorarei, mesmo que a estadia seja agradável. Encontrarei maneira de voltar a descer ou de vos fazer subir.


Seguindo o espírito da Estrela Polar, o Rei Macaco atravessou a Via Láctea.

.....continua.....

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