sexta-feira, 19 de outubro de 2012

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O Rei Macaco tinha aterrado nas encostas verdejantes do monte das Flores e dos Frutos. Há perto de quinze anos que partira. Contemplou com ternura o cume aureolado de nuvens brancas. Era o lugar do seu nascimento. Tomou o caminho da gruta  da Cortina de Pérolas, o seu palácio. Estava impaciente por voltar a ver os seus companheiros. 
Quando chegou, o regresso foi festejado com danças, cantos e, claro, com um banquete. Foram saboreados frutos suculentos, licores inebriantes... abundantemente. Ao longo das festividades, o herói contou as suas viagens, aventuras entre os humanos, os múltiplos combates. Disse também que tinha o segredo da imortalidade e os setenta e dois poderes mágicos, mas tal como prometera não os revelou e manteve secreto o nome do seu Mestre.


Desde o regresso do Rei Macaco, logo que o dia se erguia, o monte das Flores e dos Frutos ressoava de gritos e de pancadas. Gorilas e gibões treinavam-se nas artes marciais sob a condução do seu chefe que se tornara um temível especialista. Os macacos soldados não tardaram a transformar-se em combatentes experientes no manejo das lanças de bambú e das espadas de madeira. Constituiam um verdadeiro exército, disciplinado, rápido na manobra, capaz de se desdobrar em escassos minutos em diferentes formações de combate.


"Apesar de todas as suas qualidades, não têm senão armas de brincadeira. Quem sabe o que sucederia se um exército de humanos ou de demónios se aproveitasse da minha ausência e passasse ao ataque.", pensou o Macaco.
Sentou-se na erva, e pôs-se a reflectir. 
Uma luz brilhou-lhe nos olhos, fez um mudra, disse um mantra e logo se elevou nos ares. Pouco depois aterrava no telhado do Pavilhão da Harmonia Suprema, no centro da Cidade Proibida, a morada do Imperador da China. Esperou pela noite e procurou pelo arsenal militar.
Era um imenso edifício onde estavam depositadas as mais belas armas do Império do Meio. Por sorte havia também uma enorme carroça. O Rei Macaco escolheu as melhores espadas, lanças, alabardas, arcos e setas que atirou de qualquer modo para dentro da carroça. Quando esta estava cheia até mais não, sentou-se lá em cima, disse um mantra e voou, atravessando o telhado no meio de um barulho de trovão e de uma nuvem de pó.

Mesmo depois de numerosas e minuciosas buscas, os habitantes da Cidade Proibida não compreendiam quem teria feito tal buraco e roubado tantas armas de uma só vez. E sem deixar rasto... . O Imperador pediu aos seus adivinhos e mágicos que esclarececem o mistério. Consultaram o I Ching, o livro das transformações, entraram em transe  para conversar com os espíritos guardiões do palácio e acabaram por saber que um Imortal com cabeça de macaco, possuidor de muitos poderes tinha sido avistado por aquelas paragens. Então o Imperador da China mandou que escrevessem uma carta ao Imperador Celeste pedindo-lhe o castigo do culpado. A carta foi queimada e o fumo levou a mensagem ao Céu até ao trono do palácio das Alturas Celestes.

O Rei Macaco distribuira as armas imperiais aos seus soldados e agora todas as manhãs, o monte das Flores e dos Frutos ressoava de golpes mais sonoros, brilhava também de faíscas metálicas semelhantes a mil espelhos. 


Os animais da vizinhança ficaram tão impressionados que se prostraram aos pés do Macaco e reconheceram-no como seu soberano e pediram-lhe protecção. Sim, concedeu, em troca de um tributo. Deste modo, tomou ao seu serviço veados e cabritos monteses como montadas, tigres e panteras como cães de guarda.
O monte das Flores e dos Frutos tornou-se um reino poderoso, próspero e pacífico. Nenhum demónio, nenhum caçador ousava já rondar aquelas paragens.
Porém, o Rei Macaco ainda não estava satisfeito. Faltava-lhe alguma coisa. Não tinha arma ou vestuário à altura da sua categoria  e dos seus talentos. Não era ele um ser excepcional? Era necessário uma arma e uma veste extraordinárias.

.....continua.....


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